Em tempos de reforma ortográfica, podemos ver o que um dicionarista português fez ao criar um Dicionário da Língua Portuguesa no século 18.
O que impressiona é a lógica para explicar as palavras. Por exemplo, bigode, é descrito como “duas torcidas de barba”, ou a palavra tubo, que, para o lexicógrafo nada mais é que um “canal redondo”. Isso para não falar da pérola das pérolas: roda, que é singelamente apresentada como uma “bola chata”.
Certamente, a língua portuguesa é uma das belas. Entretanto, certas coisas nos saltam aos olhos quando tentamos entender o significado de algumas de suas palavras e, mais interessante ainda, quando alguém cria significados vindo de qualquer lugar, menos do senso comum que formou e dá dinamismo a uma língua. Este é o caso do lexicógrafo português Bernardo de Lima e Melo Bacelar, que no século 18, deu-se ao trabalho de criar uma obra de fôlego (muito, por sinal), o Diccionario da Lingua Portugueza.
Abaixo estão algumas palavras do referido dicionário apresentadas pela autora. Quando alguma palavra não for de nosso conhecimento geral, você terá a definição obtida através do dicionário Aulete Digital, nas notas de pé de pagina deste artigo:
Abdômen – parte do umbigo;
Água – segundo elemento;
Antraz1 – leicenço2 que come até matar;
Bacharel – falador formado;
Bigode – duas torcidas de barba;
Bilha – vaso que faz som bil-bil ao vazar;
Bisbis – som que parece rezar;
Biscoito – pão duas vezes cozido;
Bisconde – duas vezes conde;
Bismuto – meio metal;
Bisugo – peixe a quem sugam duas vezes a gostosa cabeça;
Borzeguim – bota de borrego;
Bucho – fundo do estômago;
Buço – fundo do nariz com pelinhos;
Cabra – animal de pelo;
Cachaço – caixa dos miolos;
Cachimbar – tirar fora o mau suco, fumando;
Carneiro – ovelha macho;
Castanha – bolota de certa árvore;
Castiçal – que dá fogo e luz;
Caracol – peixe glutinoso ou anfíbio, de curva ou espiral figura;
Coque – pancada no coco da cabeça;
Esbirro – o que tem de birra e prende;
Espingarda – arma que deita faíscas da pederneira ou pingas abrasadoras;
Farda – casaca nova de vários panos e cores;
Gaiola – vaso furado para ter pássaros;
Gazeta – papel que tem riqueza histórica;
Jeropiga3 – santa bebida;
Legume – grãos de cozer;
Leite – suco materno;
Lenço – pano de linho;
Louro – cor de papagaio;
Macaco – animal de trejeitos delirantes;
Murça – pele de certos ratos nos ombros eclesiásticos;
Pia – vaso purificador pelo batismo e de beber o gado;
Pigmento – cor que se põe na cara;
Porcelana – louça redonda;
Ruço – entre o vermelho e o negro;
Tarso – palma da mão ou do pé;
Tris-tris – som de vidros quebrados;
Tubo – canal redondo;
Vértebra – dobradiça das costelas;
Vertigem – rodadura do cérebro.
A descoberta dessa pérola foi feita por mim há alguns anos(1991) quando comprei num sebo, o livro As grandes anedotas da história – editado em 1976 –, de Nair Lacerda, em que vários e vários casos curiosos e pitorescos foram por ela coletados. O livro é muito bom e a introdução nos explica o significado da palavra anedota (coisa inédita, porém de breve relato). Na época em que o livro foi escrito, a autora lamentava não ser possível encontrar com facilidade um exemplar do dicionário. O que seria de nós sem a internet? Você pode ler a edição fac-similar, no portal Open Library. Clique aqui e se delicie, mas antes veja algumas das palavras contidas abaixo. A ortografia é do século 18; portanto, você terá uma pequena dificuldade inicial para entender algumas palavras, mas com cinco minutos de leitura você já poderá se considerar um exímio paleógrafo.
Após a exposição desses exemplos, a autora nos conta a história de como Bernardo de Lima e Melo Bacelar classificou a palavra silogismo – raciocínio sobre duas premissas, acrescentando “Veja: Ceroulas”. É de chorar de rir. Porém, o lexicógrafo, apesar de tudo foi capaz de escrever uma gramática que foi muito importante e erudita, a Gramática Filosófica da Língua Portuguesa. Dá para entender?
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1 Infecção cutânea, gastrintestinal ou pulmonar grave, causada pelo Bacillus anthracis ou seus esporos, que ocorre esp. em caprinos, equinos e ovinos, e pode ser transmitida ao ser humano pelo contato direto com animais doentes ou com seus dejetos, pela ingestão de carne contaminada ou ainda pela inalação dos esporos do bacilo; CARBÚNCULO [F.: Do gr. ánthraks, akos, pelo lat. anthrax, acis.]
2s. m. || fleimão, furúnculo
3sf. – 1 Bebida preparada com mosto, açúcar e aguardante; 2 Enol. Vinho de fermentação alterada pela adição de aguardante; 3 Vinho de má qualidade; ZURRAPA. [F.: De or. obsc.]
Pô, Jorge! Tenho acompanhado você no meu leitor virtual, e fico impressionada com os seus achados. Ainda não comentei os vídeos porque preciso ouvi-los com calma, e ando meio atolada, novamente às voltas com alguns problemas de saúde, dentre otras cositas.
Mas tenho acompanhado tudinho, viu? Não passa nada sem que eu leia por lá, que é onde me “enfio” para atualizar-me rapidamente com o pensamento dos amigos, já que não consigo visitar a todos com a frequência desejada.
Ainda quanto a esse post, os que me causaram uma certa “rodadura no cérebro”:
“rodadura no cérebro”:
“Murça – pele de certos ratos nos ombros eclesiásticos;
Pia – vaso purificador pelo batismo e de beber o gado;”
Bjs, Jorge, e inté!
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Ju, eu fico muito contente com as suas palavras e isto me dá mais motivação para continuar apresentando coisas legais e bacanas para os amigos.
bjs
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Jorge
Um verdadeiro serviço de utilidade pública seu post!
beijo
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Oi, Elisabete!
Fiquei muito feliz por sua visita e palavras. Obrigado.
bjs
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